E foi só dois dias depois que me dei conta de que não vou mais te encontrar sentada na varanda, cochilando ou olhando as pessoas passarem. Ou encostada em algum canto da casa, comendo, quietinha, seus biscoitos e dizendo pra eu deixar de ser bobinha e comer também. Ou então andando pra lá e pra cá quando não tem o que fazer, tentando espantar aquele soninho que sempre vinha pesar seus olhos já cansados. Que saudade de voltar a ver o que eu não via há tanto tempo. Que tristeza por não ter visto a tempo, não ter visto de novo. Não ter te abraçado ou pintado suas unhas como eu sempre fiz quando ia visitar, porque as minhas mãos sempre foram iguais as suas, e eu queria que quando eu estivesse assim, velhinha, alguém também viesse deixa-las mais bonitas. Eu sempre fui tão parecida com você, não é? Esse jeito tranqüilo e desligado. E agora, com quem vou parecer? Quem vai comer danone com o dedo comigo e depois lamber o potinho? Até agora, não tinha me dado conta do quanto vou sentir sua falta e do quanto me arrependo por estar a tanto tempo sem visitá-la. Daria qualquer coisa pra ver esse meio sorriso mais uma vez. Só mais uma.
Lembra quando eu era mais nova e ficava comparando sua pele com a minha? Eu esticava a sua, depois a minha. Eu sorria sempre, porque a sua demorava pra voltar pro lugar e você dizia: é por que eu só tenho 20 anos. E eu sorria mais.
Perdoe-me por não ter me despedido. Eu só não queria lembrar da minha avó de outro jeito que não esses. Os meios sorrisos. O olhar calmo e acolhedor. Os gestos delicados. O jeito tímido e sempre muito discreto. A pessoa mais parecida comigo.
Eu sei que agora você está em lugar melhor, muito melhor que esse, mas não posso deixar de sentir falta ou sentir umedecer os olhos quando for falar sobre você.

Fique bem, aonde quer que esteja, vó.

Um dia vamos nos encontrar de novo e vou poder te abraçar como nao faço a anos.

Até logo!

Nany.